A importância de nunca esquecer

Valsa com Bashir (Vals Im Bashir, Israel/Alemanha/França, 2008)
Dir: Ari Folman

A animação israelense em 2D Valsa com Bashir é ao mesmo tempo filme de guerra e documentário histórico. Acima de tudo, é um filme que trata da necessidade de guardar na memória momentos importantes ou decisivos; é sobre nunca esquecer o passado e de como ele nos molda, para o bem ou para o mal.

Ari Folman, o próprio diretor do filme, é o personagem principal que há mais de 20 anos lutou como soldado na 1º Guerra do Líbano ao lado do exército de Israel, mas atualmente não consegue se lembrar de nada do que viveu na época. A partir disso, ele começa a procurar amigos que estiveram com ele no front para relembrá-lo daqueles dias ou mesmo especialista que possam explicar essa deficiência em sua memória.

Assim, a realização do filme é a forma encontrada pelo diretor para expurgar um certo sentimento de culpa pessoal (algo como forma de terapia), uma vez que na citada guerra, mais especificamente nas batalhas de Sabra e Shatila, uma milícia libanesa, após o assassinato de seu líder Bashir Gemayel, resolveu exterminar milhares de refugiados palestinos como forma de retaliação pelo atentado ao líder libanês. Tudo isso com a cumplicidade do exército israelense.

Todo o filme possui uma sensação de melancolia, ressaltada pelas crueis descobertas do personagem, numa narrativa que intercala os encontros de Folman e seus amigos com as cenas no campo de batalha. O processo de animação busca o máximo de realismo possível, através de um desenho sem simples, mas eficaz. A trilha sonora reforça bastante esse sentimento, ao mesmo tempo que evoca um ar quase surreal para as lembranças re-encontradas do personagem.

E por mais que o filme traga essa atmosfera de melancolia, há de se dizer que possui imagens graficamente belíssimas, num dos trabalhos de fotografia mais incríveis que eu vi numa animação. A intensidade das cores só reforça a crueza submetida àqueles que são mandados para um campo de batalha e contrasta com momentos de mais pura tristeza ou solidão vividos pelo personagem quando o ambiente se torna obscuro e sombrio.

Em certo aspecto, o filme me lembra o corajoso documentário Santiago, de João Moreira Salles, quando o diretor sabe olhar para si mesmo e tentar entender suas atitudes passadas. Em outro patamar, mas mais evidente ainda, Valsa com Bashir remete à obra-prima de Alain Resnais Hiroshima, Meu Amor (seu filme de estreia, 1959), também sobre os meandros da memória em tempos de recordar os absurdos da guerra e de como ela é capaz de destruir nossas vidas ou a realização de uma existência melhor. E nada mais chocante e brutal do que as rápidas imagens reais que concluem o filme. De arrepiar.

2 thoughts on “A importância de nunca esquecer

  1. Num primeiro momento, fiquei com certo receio com esse filme, com medo de ser mais uma animação adulta no estilo Persépolis, que, apesar de bom, me decepcionou bastante. No entanto, me parece que é mesmo algo a mais. Aguardo ansiosamente por aqui, mas, provavelmente, só conseguirei ver em dvd.

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