7º Festival Internacional de Cinema de Salvador – Parte 2

Importante cineasta polonês, homenageado pelo evento, Andrzej Wajda teve uma pequena retrospectiva de sua obra exibida na cidade. A seleção privilegiou os filmes menos conhecidos do cineasta, muitos deles nunca exibidos no Brasil. Só pude ver dois deles. Um é clássico, o outro, mais recente, é devastador.

O Homem de Mármore (Czlowiek z marmuru, Polônia, 1977)
Dir: Andrzej Wajda


Como um Cidadão Kane comunista, esse O Homem de Mármore é a busca pela reconstrução de uma personagem. No filme de Wajda, a pessoa em questão é um pedreiro tido por muitos como líder proletário que fortaleceu a imagem do movimento trabalhista e deu forças à luta de classes na década de 50.

25 anos depois, Agnieszka (Krystyna Janda, em seu primeiro papel no cinema) está fazendo um filme/tese de conclusão de curso sobre esse personagem, Mateusz Birkut (Jerzy Radziwilowicz). Ela vai enfrentar o próprio sistema comunista vigente para desenterrar as verdades sobre a real participação de Birkut no processo “revolucionário”, a despeito das pessoas e poderes que estavam por trás de toda aquela história.

Portanto, o filme é sobre a força da imagem (em movimento ou aquela representada pela estátua de mármore de Birkut) enquanto construtora de ídolos que mais tarde seriam esquecidos, e Wajda filma com o vigor de quem também teve dificuldades para criticar o próprio sistema comunista que forjava seus símbolos efêmeros para criar proximidade com o povo.

Mesmo assim, o filme perde um pouco da força pela tentativa de exagerar na contundência com que os atores defendem seus personagens e pronunciam o texto, soando levemente panfletário (Agnieszka é totalmente determinada, Birkut é visto como o fantoche coitado). De qualquer forma, a história é muito bem resolvida, sem soar forçada. O Homem de Mármore ganhou uma continuação mais famosa (O Homem de Ferro, Palma de Ouro no Festival de Cannes em 1981), trilhando o mesmo caminho da denúncia embasada e nunca desrespeitosa com seus personagens e realidade histórica.

Cálamo (Tatarak, Polônia, 2010)
Dir: Andrzej Wajda


Cálamo é um filme em processo, ou o processo de um filme. Intercalado pelas intervenções da própria atriz principal com seu relato de vida, a história cresce assustadoramente e faz um belo estudo sobre a morte e sobre a necessidade de se conviver com a possibilidade dela.

O filme conta a curta história da mulher de um médico que possui uma doença terminal que irá vitimá-la em poucos meses; no entanto, só o marido sabe disso e decide não contar-lhe. Ao mesmo tempo, ela se vê envolvida com um rapaz mais jovem, na medida em que não consegue esquecer a morte dos filhos pequenos ocorrida durante a Segunda Guerra.

Mas o extra-filme vai invadir a história quando o diretor de fotografia do filme, Edward Klosinski, marido da atriz principal, Krystyna Janda (a mesma de O Homem de Mármore e vários outros trabalhos do diretor), morre. As filmagens param, mas retornam meses depois com uma condição da atriz: que seus depoimentos sobre a morte do marido sejam incluídos no filme.

É um prato cheio para Wajda reforçar o discurso da obra, fazendo dialogar muito bem as duas metades. É como se o depoimento real da atriz conferisse força a sua personagem dentro da história (ela se autoajuda). Quando as duas partes se misturam, o longa tem seus melhores momentos (a cena em que a atriz abandona o set de filmagens é sensacional). Krystyna Janda revela a grandiosidade de sua atuação numa entrega poucas vezes vista dessa forma e ajuda enormemente a dar consistência, contundência e sensibilidade a uma história sobre o enfrentamento diante do morrer.

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